Senado aprova Código de Defesa do Contribuinte: novo marco contra devedores contumazes e ponte para a reforma tributária

Senado aprovou, por unanimidade, o Código de Defesa do Contribuinte, um marco que redefine a relação entre empresas e Fisco no Brasil.

No dia 2 de setembro de 2025, o Senado Federal aprovou, de forma unânime, o Projeto de Lei Complementar nº 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte. Agora, a proposta segue para a Câmara dos Deputados.

O texto chega em um momento de intensa transformação do sistema tributário brasileiro, marcado pela reforma tributária 2025 e pela criação de mecanismos modernos de controle, como o split payment. Mais do que um novo diploma legal, o Código se apresenta como uma resposta do Estado à inadimplência fiscal sistemática e à prática de empresas que acumulam dívidas enquanto expandem seus negócios ou patrimônios pessoais.

O que é o Código de Defesa do Contribuinte?

O Código de Defesa do Contribuinte é uma legislação que busca equilibrar direitos e deveres na relação entre contribuintes e Administração Tributária.

Entre os pontos centrais, estão:

  • Presunção de boa-fé do contribuinte;

  • Garantia de ampla defesa e contraditório;

  • Vedação de práticas abusivas de cobrança;

  • Incentivo à resolução cooperativa de litígios fiscais.

Ou seja, o texto não tem apenas um viés punitivo: ele reconhece que a maioria dos empresários cumpre com suas obrigações e precisa de segurança jurídica e previsibilidade nas relações com o Fisco.

Quem é o devedor contumaz?

Um dos grandes avanços do Código foi a definição clara do devedor contumaz — figura que até então era alvo de discussões jurídicas e diferentes interpretações.

  • No âmbito federal: será considerado devedor contumaz aquele com dívida superior a R$ 15 milhões, desde que o montante ultrapasse 100% do patrimônio conhecido.

  • Nos estados e municípios: caracteriza-se quando o contribuinte deixa de pagar tributos em quatro períodos de apuração consecutivos ou seis alternados em 12 meses, sem justificativa plausível.

Essa definição elimina brechas legais e facilita a atuação coordenada da Receita Federal e dos fiscos estaduais e municipais.

Quais são as sanções previstas?

O devedor contumaz sofrerá restrições severas, entre elas:

  • Exclusão de benefícios fiscais;

  • Proibição de participar de licitações públicas;

  • Impedimento de firmar contratos com o poder público.

Na prática, isso significa que empresas com dívidas injustificadas não poderão mais competir em igualdade de condições com aquelas que cumprem suas obrigações.

Como agem os devedores contumazes?

O modelo mais comum de atuação é o empresário que, ao invés de pagar seus tributos, opta por direcionar o caixa para patrimônio pessoal — comprando imóveis, veículos de luxo ou reinvestindo em negócios paralelos — e empurrando sua dívida tributária por meio de parcelamentos sucessivos.

Esse comportamento cria um ambiente de concorrência desleal, pois empresas adimplentes acabam arcando com custos mais altos, enquanto concorrentes inadimplentes conseguem oferecer preços artificialmente mais baixos.

Incentivos para o bom contribuinte

O Código também cria espaço para reconhecer e premiar o bom pagador. Programas de conformidade tributária como Confia, Sintonia e OEA ganham mais destaque, garantindo benefícios como:

  • Redução de multas;

  • Prioridade em processos administrativos;

  • Bônus de adimplência.

Essa lógica fortalece a cultura do compliance fiscal, incentivando empresas a manterem histórico positivo com a Receita.

Conexão com a reforma tributária: o split payment

Um dos pontos mais relevantes é a conexão entre o Código e a reforma tributária 2025, especialmente com a implementação do split payment no Brasil.

O split payment é um mecanismo pelo qual o valor do imposto destacado na nota não passa mais pela conta do empresário. O banco recolhe automaticamente a parcela do tributo e repassa diretamente ao governo.

Na prática:

  • Hoje, o empresário recebe o valor total da nota e decide se vai pagar o imposto no prazo.

  • Com o split payment, o recurso correspondente ao tributo nunca entrará no caixa da empresa.

Isso representa o fim do uso do imposto como capital de giro ou como recurso para financiar patrimônio pessoal.

Responsabilidade penal tributária

O Código não cria novos crimes, mas facilita a atuação conjunta da Receita Federal e do Ministério Público em casos de fraude.

Condutas como sonegação fiscal, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro poderão ser apuradas de forma mais ágil, especialmente quando ligadas à figura do devedor contumaz.

Outro ponto crucial: a extinção da punibilidade pelo simples pagamento do tributo não será mais aplicável em crimes contra a ordem tributária e previdenciária. Isso torna a legislação mais rígida e aumenta o risco de responsabilidade penal tributária.

Impactos práticos para o empresário

Curto prazo:

  • Empresas com grandes dívidas podem perder benefícios fiscais e ser impedidas de participar de licitações já na vigência da lei.

Médio e longo prazo:

  • Com o split payment, o fluxo de caixa será impactado. O imposto não poderá mais ser utilizado para financiar operações ou investimentos antes de ser recolhido.

Empresários precisarão repensar estratégias de planejamento financeiro e tributário para lidar com a redução dessa “margem de manobra”.

Perspectivas jurídicas

É esperado que a nova lei gere debates no Judiciário, especialmente em torno de conceitos como:

  • O que constitui dívida “injustificada”;

  • Critérios de avaliação do patrimônio conhecido;

  • Aplicação das regras em diferentes entes federativos.

Advogados tributaristas já preveem questionamentos constitucionais, mas a tendência é que o texto fortaleça a posição da Receita Federal e reduza as chances de manobras protelatórias.

Conclusão

O Código de Defesa do Contribuinte é um divisor de águas. De um lado, oferece mais segurança jurídica e benefícios para bons contribuintes; de outro, cria um ambiente de maior rigor contra inadimplentes contumazes.

Aliado ao split payment da reforma tributária, o novo Código transforma a forma como as empresas lidam com tributos no Brasil. Empresários precisarão se preparar para um cenário em que inadimplência fiscal, patrimônio oculto e parcelamentos eternos deixam de ser opções viáveis.

Cinthia Carvalho
Sócia ContabExpress

Administradora pós-graduada em controladoria e auditoria pela FGV, com mais de 12 anos de atuação na área de auditoria tributária e no atendimento ao cliente.

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